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As boas-vindas do segundo dia da programação (28) do ConsejuRS foram realizadas ao som de Nei Lisboa e Belchior, na voz do músico Lico Silveira. O segundo dia da programação do ConsejuRS foi voltado para o debate sobre a conjuntura e a busca de novas perspectivas de futuro sob a ótica do Bem Viver. A partir de eixos temáticos, as rodas de conversa se desenvolveram com a orientação dos convidados, que apresentaram panoramas de acordo com suas áreas de atuação. 

Na parte da manhã, a discussão foi em torno da provocação “Justiça para quem? O Bem Viver como Direito Fundamental”. A mediação da atividade ficou sob responsabilidade do secretário-geral do Sindjus, Fabiano Zalazar, e da integrante da Colegiada e representante do Núcleo dos Aposentados do Judiciário Estadual (NAP), Márcia Ferro Amaro. 

A primeira roda de conversa do dia apontou caminhos para possibilitar que o conceito do Bem Viver seja assegurado para toda a população sob a forma de direitos. Debatendo a atuação do Sistema de Justiça na defesa da Democracia, do Estado e dos Direitos Sociais, o jurista Lênio Streck destacou que esses direitos e ideais de Bem Viver estão expressos na Constituição brasileira com objetivo principal de “desigualação da desigualação”, ainda que não sejam efetivamente garantidos.

No entendimento do pós-doutor em Direito, o que está em crise não é a democracia, mas os insumos da democracia. Ele apontou fatores que em sua avaliação favoreceram a fragilização do Estado Democrático de Direito e levaram ao golpe de 2016 e à prisão política do presidente Lula. Streck fez uma análise da relação entre as jornadas de junho de 2013, a lei anticorrupção, o lavajatismo, a exaltação dos outsiders da política e o surgimento do bolsonarismo. Na sua avaliação, 2013 era o “ovo da serpente” e a soma de todos esse elementos culminaram no Oito de Janeiro. Neste sentido, o jurista fez o questionamento se essa ameaça realmente está derrotada.

Em contraponto, a vereadora Karen Santos ressaltou a importância de ampliar o olhar sobre o que estava em debate nas jornadas de junho: “As pessoas dizem que 2013 abriu as portas para o golpe, mas ignoram todo o contexto de violações de direitos e criminalização que estavam presentes naquele momento”, citando a política de encarceramento e de criminalização dos movimentos sociais. 

Integrante da primeira Bancada Negra da Câmara de Vereadores de Porto Alegre, Karen Santos frisou que a “sociedade nega a perspectiva do oprimido, hoje pelas ações afirmativas tentamos compensar dentro da universidade, do parlamento. É necessário, entretanto, desenvolver a crítica de como essas instituições fazem a manutenção das desigualdades. 

Como liderança jovem e à frente do Coletivo Alicerce, Karen Santos aponta é fundamental que o arranjo social seja reorganizado, inclusive, “para que a gente consiga fazer com que leis progressistas saiam do papel” e para mudar a configuração do Judiciário, que ainda opera pela manutenção das opressões. “Quem tem condição de recorrer até a última instância? Os instrumentos de defesa do povo não estão no sistema de justiça e não dá conta de dar resposta a todas essas injustiças que a gente enfrenta no nosso cotidiano”, salientou, citando exemplos como a necessidade de desmilitarização das polícias, reforma urbana,  repensar a lógica do transporte público como medidas para enfrentar efetivamente o racismo estrutural.

Na compreensão de que para assegurar o Estado dos Direitos Sociais é fundamental o papel dos movimentos de raça, gênero e diversidade, a juíza Karen Luise de Souza relatou sua atuação junto ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) pela inclusão da pauta racial na perspectiva do Judiciário. Supervisora do Programa de Equidade Racial do Conselho, ela relatou que está percorrendo diversas regiões do país em um mutirão de fiscalização carcerária: “nós não temos espaços de ressocialização, temos espaços de aniquilamento”. Apontando que é preciso fazer o debate sobre o assunto com recorte racial, lembrando que no RS, 40% das pessoas encarceradas são negras (sendo que os negros correspondem a 20% da população). Nesse contexto, é importante a participação de juízas e juízes negros na instituição para ampliar o olhar sobre o papel do Judiciário junto à sociedade.

Um dos instrumentos para viabilizar a presença de mais pessoas negras na magistratura é através da política de cotas, uma das bandeiras de luta do Coletivo pela Igualdade Racial do Sindjus (CIRS). Sobre o tema, Karen Luise alerta que no RS a legislação afirmativa de vagas no serviço público, que é de 2021, tem vigência de apenas três anos. Citando entraves na forma de aplicação dos concursos públicos (especialmente o ingresso na magistratura) que dificultam a participação de pessoas negras, pontuou que é necessário repensar todo o processo de seleção para garantir com igualdade de condições a participação em todos os espaços.

A juíza de Direito destacou que “nosso país só vai ser para todas as pessoas quando todas as histórias forem respeitadas”, referindo-se à importância da pluralidade e da inclusão  da perspectiva de vida e saber da população negra em todas as instituições, desde a educação. No âmbito da Justiça, frisou, é necessário  estabelecer diretrizes para fazer de forma consciente a inclusão de negras e negros e não apenas para “colorir o Judiciário, mas fazer uma representatividade crítica, pra chegar nesse lugar e pautar livre e conscientemente as questões de raça e gênero” e, desta forma “todos possam experimentar esse Bem Viver nas mesmas condições”, assegurando a necessidade da inclusão racial para a efetiva justiça social.

 

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IIV CONSEJU - RS | DIA 2