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Por Coletivo pela Igualdade Racial do Sindjus (CIRS)

Como é de se esperar em uma sociedade que invisibiliza a mulher, sobretudo aquelas de cor preta, a maioria não sabe,  mas deveria saber, o dia 25 de julho é marcado por ser o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha. Também, em nível nacional, é o Sia de Tereza Benguela, uma grande líder quilombola do século XVIII, que por sua luta se tornou símbolo de resistência e liderança. Muito mais que um dia no calendário, a data é carregada de um simbolismo de luta e resistência que faz parte do dia a dia das mulheres negras.

Em vários movimentos negros, está sendo criado o Julho das Pretas, a exemplo do mês de novembro, dedicado à causa antirracista a partir da data de 20 de novembro, hoje feriado nacional. Nós, o Coletivo pela Igualdade Racial do Sindjus (CIRS), juntamente com nosso sindicato, não podemos deixar de marcar nossa presença nesta data que nos traz esse recorte tão importante dentro da nossa luta e da nossa sociedade.

A luta das mulheres negras tem muita história e, no nosso país, remete ao vergonhoso período da escravidão, época em que diversas lideranças negras femininas se ergueram contra os horrores daquela situação a que foram submetidas. A mulher negra traz consigo as marcas de uma violência extrema, mas também o anseio por uma sociedade justa!

As mulheres negras sofreram na carne a separação de seus entes queridos, lhes foram negados os direitos de criarem seus filhos, manterem suas famílias, suas culturas, e sobretudo, lhes tiraram as identidades e sua ancestralidade. Mesmo assim, sempre lutaram pelo seu povo. Enquanto o ideal feminino era marcado na cultura por delicadeza, perfumaria e sensibilidade, essas mulheres trabalharam pesado, eram vítimas de estupro e seus filhos lhes eram retirados. Como dizia Sojourner Truth, se à mulher cabia cuidar da família e do lar, onde estavam as mulheres negras? Por acaso não eram mulheres?

Pois são essas mulheres que, dentro da justiça, têm um olhar para o Protocolo de Julgamento com Perspectiva Racial. Este importante protocolo, lançado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e que visa à se alinhar às decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), deveria servir como um guia para as futuras decisões e julgamentos com um olhar sobre importantes recortes dessa sociedade, como a questão de raça/cor e identidade de gênero.

Numa sociedade como a nossa, cujo racismo estrutural é incontroverso, o resultado de decisões influenciadas por essa prática fica evidente quando se contabiliza o número de pessoas negras na nossa população carcerária. O número e o tempo de condenações dadas a esses em relação à população branca é bem superior. Então, o Coletivo pela Igualdade Racial do Sindjus lutará para que o Tribunal de Justiça (TJRS) implemente de fato o Protocolo nas suas decisões. Toda a sociedade quer decisões imparciais e mais justas. Todos ganham com isso.

É preciso que a sociedade entenda, de uma única vez, que a luta da mulher negra não é uma luta individual, mas sim uma luta de todos.

E aqui, cabe a famosa frase de Angela Davis, que disse que “quando a mulher negra se movimenta, toda a estrutura da sociedade se movimenta com ela”. E é assim, pois estamos na base da pirâmide social e não há segmento com maior sede de justiça social, de igualdade e de respeito.

A interseccionalidade é um fator importante. Uma vez estudada, traz para o cenário atual a experiência da mulher negra em todas as suas combinações da sociedade. Desde a ama de leite que amou o filho da sua “senhora branca” como se fosse o seu, da mãe que chora sobre o corpo preto do filho, ceifado por causa da cor. A mulher que entende como ninguém o preconceito de raça, de cor, de gênero, de classe e a misoginia na sua mais forte expressão.

Mas não queremos aqui destacar esta data só para lembrar das coisas tristes mas, principalmente, para celebrar a garra, a força e a fé dessas mulheres.

Não subestimemos a mulher negra brasileira, que traz como herança 388 anos de escravidão e mais 135 anos seguidos de racismo e preconceitos e, ainda assim, consegue ser, segundo dados do Relatório sobre Desenvolvimento Humano-Pnud (o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), a maior parte da população brasileira. De acordo com o relatório, somavam 60 milhões de pessoas em maio de 2024.

Estamos aqui para celebrar nossas ancestrais, cujas lágrimas e o sangue derramado em gloriosas lutas deram origem a novas e atuais guerreiras, cujos nomes são muitos, ainda que a sociedade as invisibilize.

Podemos citar aqui grandes nomes do nosso país, como a professora e liderança Lélia Gonzales, a poeta e historiadora Maria Beatriz Nascimento, a revolucionária Luísa Mahin, a professora universitária Ana Flávia Magalhães Pinto, a assistente social e ativista Maria de Lourdes Vale Nascimento, a escritora Ana Maria Gonçalves,  as atrizes Taís Araújo e Zezé Motta, a cantora Liniker, a vereadora Karen Santos, e claro, a escritora e linguista Conceição Evaristo. E outras não tão conhecidas, como você, que está lendo este texto, e que traz no DNA a sede de justiça e igualdade.

Que força misteriosa move essas mulheres que, apesar de todas as intempéries da vida, existem e resistem. São vitoriosas! Sim, são sábias e sim, são mulheres de fé! Fé na vida. Fé na luta e fé na esperança de um mundo onde a igualdade racial e o fim dos preconceitos deixarão de ser um sonho utópico para se tornarem uma realidade.

No dia 25 de julho, aqui na nossa Porto Alegre, muitas estarão reunidas na Marcha das Mulheres Negras para mostrarem a força, a fé e a coragem que possuem e que fazem com que sejam poderosas e sábias. Não existe força mais poderosa no mundo do que o amor! Um dia todos saberão disso. Um dia.

Você, mulher, venha se juntar a nós. Venha lutar contra o racismo, a misoginia, as questões de classe, de gênero. Venha lutar contra todas as formas de preconceitos. Venha ajudar a construir um mundo melhor. Venha marchar com as mulheres negras!