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Nós, mulheres de hoje, temos um compromisso com a História

Momentaneamente, estou despida de minha função profissional. Falo aqui essencialmente como mulher. E minha mensagem hoje é dirigida às mulheres. Começo com uma pergunta: de que lugar vocês me leem hoje? De uma situação de conforto ? De quietude? Ou de incômodo? Angústia? Temor?

Sei que sou compreendida. Essas palavras não foram escolhidas ao acaso, minhas companheiras. Elas traduzem muitas sensações que diariamente experimentamos no exercício de viver. Sim. Porque para a mulher, mesmo o existir é atravessado por profundas dificuldades. A realidade nos é sufocante. 

Quantas vezes já sofremos caladas? Quantas palavras duras já engolimos por acreditar que delas éramos merecedoras? Quantos silêncios pesaram sobre nós quando tudo de que precisávamos era uma única palavra de apoio? Me faço as perguntas que gostaria que vocês se fizessem, companheiras. e com o desejo de que esses questionamentos não ecoem no vazio da solidão em que muitas vezes nos encontramos ao não repartirmos nossas angústias.

Quero aqui dizer a vocês, a todas e a cada uma de vocês, que não estamos sozinhas. Cada vez que você se sentiu diminuída por um comentário maldoso, eu estava lá. Cada vez que você duvidou de sua capacidade porque lhe tiraram o  direito à palavra, eu estava lá. Cada vez que você se sentiu insuficiente ou duvidou de seu valor porque o muro de opressão se colocou à sua frente, eu estava lá. Ao lado de muitas outras mulheres, durante muitas gerações, partilhando dos mesmos anseios, dos mesmos temores e das mesmas angústias. Olhe em volta. Você não está sozinha, e é mais forte do que imagina.

Há um grande esforço para nos manter solícitas, mansas, inofensivas, dóceis. Para isso, é necessário nos manter caladas. Durante muitos séculos, isto pareceu tarefa fácil de realizar. Bastava impor um discurso uno, baseado numa doutrina quase inquestionável, que acabava por nos convencer de que nosso lugar era o da submissão. Felizmente, nos tiraram as vendas dos olhos. Mulheres fortes e corajosas ao longo da história não se conformaram e ousaram desafiar as leis sociais que pareciam inamovíveis. E pavimentaram o caminho para nossa redenção e nossa libertação.

No presente, é nossa a missão de continuar esse legado. Hoje somos nós as protagonistas desse processo permanente de libertação – e precisamos tomar as rédeas! É um caminho sem volta. Não retrocederemos. Façamos nossa parte, ainda que não consigamos viver tempo suficiente para colher todos os frutos de nossa luta. Por nossas filhas, netas e pelas que vierem depois delas. A esperança para as próximas gerações depende de nós, de que não aceitemos a opressão e que não nos calemos diante das injustiças. O patriarcado não se consolidou do dia para a noite, e sua desconstrução tampouco se dará desta forma.

 

Juliana Campani é jornalista, mãe do Daniel, com atuação na área política e social e lutadora pelos direitos humanos. Atua na Comunicação do Sindjus/RS.