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A política de metas e produtividade, contida na Resolução 219, é muito mais que a transformação do processo físico para o processo eletrônico. Ela representa uma nova forma de trabalhar, um novo processo cognitivo, em que o domínio das tecnologias de informação são pontos decisivos nessa mudança do mundo do trabalho. Entendemos que na organização do trabalho, deve ser mudado o conceito de chefe, ou seja, aquele que manda e que outro obedece. Hoje as organizações investem em um conceito de líder, aquele que motiva, incentiva, orienta e coordena. Assim, a função de chefia atualmente tem um duplo desafio, pois além de executar o trabalho, o chefe ou líder tem que gerenciar, sempre entendendo que as pessoas são diferentes e respeitando os limites individuais de cada um. Fazendo uma analogia com um técnico de futebol, ele monta seu time a partir das qualidades e particularidades dos seus jogadores, para conseguir uma equipe. No serviço público, a dinâmica é semelhante: o gestor deve lidar com procedimentos laborais e cognitivos diferentes, portanto, gerenciar é conseguir uma dinâmica de trabalho, valorizando as capacidades individuais de cada um, em busca de uma melhor produção e sempre proporcionando cursos de aperfeiçoamento e atualização. Portanto, a essência da política de metas e produtividade é que se reduza o estoque processual, agilize-se os processos em andamento, além da entrada, análise e conclusão de novos processos.

A produtividade é importante para o cidadão, que deseja a celeridade judicial e que o andamento processual seja mais ágil. A exigência de produtividade faz parte da NPM (New Public Management), a nova forma de se administrar o serviço público, que é uma das características do judiciário 4.0. Com relação a isso, a resolução 219 permite adaptar a política de metas e produtividade à realidade de cada tribunal. Em 2021, o servidor do Judiciário lida com processos físicos, processos em fase de digitalização, processos digitalizados e processos eletrônicos. 

No entanto, o que acontece na dinâmica do trabalho do Judiciário é o aumento da demanda na entrada de processos, um grande número de processos em andamento mas não finalizados, e um grande número de processos de estoque processual. O problema é que a emenda complementar 95 impede gastos no serviço público, o que não permite novos concursos. Neste contexto, muitas comarcas possuem um número reduzido de servidores, e mesmo assim mantém-se uma exigência de carga de trabalho, produtividade e velocidade incompatíveis com a relação do número de processos/servidor. Isso traz danos para a saúde mental do trabalhador, que muitas vezes se sente culpado de não conseguir efetuar o trabalho excessivo, exigido de forma abusiva. No Judiciário, a redução do número de servidores se deve à falta de concursos, reforma da Previdência, aposentadoria precoce de vários servidores, licença-saúde, entre outros. Os relatórios sobre adoecimento no Judiciário apontam que os afastamentos por saúde mental estão em um nível preocupante. Isso se deve, muitas vezes, às cobranças excessivas por produtividade, ao assédio moral, ao desrespeito, à discriminação, à mistura de jornada com produtividade, com ordens de trabalho nas redes sociais a todo momento, invadindo o espaço social e familiar do servidor. Esses são fatores de riscos invisíveis, chamados riscos psicossociais, que podem contribuir para o aumento do estresse. A evolução desse quadro pode levar ao esgotamento profissional (burn-out), síndrome do pânico, ansiedade, depressão e outras doenças psicossomáticas. 

Para exemplificar a relação de uma organização do trabalho preocupada apenas com números e não com as pessoas que executam o trabalho, vamos dar como exemplo uma secretaria de 10 pessoas, exigindo uma produtividade “x”. Ao reduzir o número de funcionários, não importa qual o 

motivo, exige-se manter a mesma meta de produtividade, o que sobrecarrega, gera sofrimento e adoecimento. A saúde do trabalhador está ligada diretamente à organização do trabalho, pois um gerenciamento autoritário, que não escuta sugestões e não adapta a política de metas e produtividade à realidade de cada tribunal, não conseguirá a produtividade desejada, e sim o adoecimento da equipe de trabalho. 

Por outro lado, um exemplo de gerenciamento e autogestão de grupo com responsabilidade e profissionalismo cria um ambiente saudável e produtivo no trabalho. Dessa forma, equipes do Judiciário federal conseguiram o selo diamante, devido à interação entre as pessoas que trabalhavam em sinergia e também com autonomia. Isso foi possível porque os magistrados e os chefes davam aos seus funcionários autonomia para resolver os problemas que surgissem. Portanto, fica provado que quando as pessoas têm uma relação de amizade, um ambiente de respeito e urbanidade, a produção aumenta. Entretanto, quando a gestão é feita por terror, estresse ou assédio moral, o resultado é desmotivação, sofrimento, adoecimento e baixa produtividade.

 

Arthur Lobato 

Psicólogo/Saúde do trabalhador.